"Há horas em
nossas vidas que somos tomados por uma enorme sensação de inutilidade, de
vazio... Questionamos o porquê de nossa existência e nada parece fazer sentido.
Concentramos nossa atenção no lado mais cruel da vida, aquele que é implacável
e a todos afeta indistintamente: AS PERDAS DO SER HUMANO! Aonascer, perdemos o aconchego, a segurança e a
proteção do útero. Estamos, a partir de então, por nossa conta. Sozinhos.
Começamos a vida em perda e nela continuamos. Paradoxalmente, no momento em que
perdemos algo, outras possibilidades nos surgem. Ao perdermos o aconchego do
útero, ganhamos os braços do mundo. Ele nos acolhe: encanta e assusta, nos
eleva e nos destrói... E continuamos a perder... E seguimos a ganhar.Perdemos primeiro a inocência da infância. A
confiança absoluta na mão que segura nossa mão, a coragem de andar na bicicleta
sem rodinhas porque alguém ao nosso lado nos assegura que não nos deixará
cair... E ao perdê-la, adquirimos a capacidade de questionar. Por que? Perguntamos
a todos e de tudo... Abrimos portas para um novo mundo e fechamos janelas,
irremediavelmente deixadas para trás... Estamos crescendo. Nascer, crescer,
adolescer, amadurecer, envelhecer, morrer, renascer(?)... Vamos perdendo aos
poucos alguns direitos e conquistando outros. Perdemos o direito de poder
chorar bem alto, aos gritos mesmo, quando algo nos é tomado contra a
vontade.Perdemos o direito de dizer
absolutamente tudo que nos passa pela cabeça sem medo de causar melindres.
Assim: se nossa tia às vezes nos parece gorda tememos dizer-lhe isso. Receamos
dar risadas da bermuda ridícula do vizinho ou puxar as pelanquinhas do braço da
avó com a maior naturalidade do mundo e, ainda, falar bem alto sobre o assunto.
Estamos crescidos e nos ensinam que não devemos ser tão sinceros. E
aprendemos... E vamos adolescendo... Ganhamos peso, ganhamos seios, ganhamos
pelos, ganhamos altura... Ganhamos o mundo. Neste ponto, vivemos em grande
conflito. O mundo todo nos parece inadequado aos nossos sonhos... Ah! E os
sonhos!!! Ganhamos muitos sonhos. Sonhamos dormindo, sonhamos acordados,
sonhamos o tempo todo. Aí de repente, caímos na real! Estamos amadurecendo...
Todos nos admiram. Tornamo-nos equilibrados, contidos, ponderados. Perdemos a
espontaneidade.Passamos a utilizar o
raciocínio, a razão acima de tudo. Mas, não é justamente essa a condição que
nos coloca acima(?) dos outros animais? A racionalidade, a capacidade de
organizar nossas ações de modo lógico e racionalmente planejado? E continuamos
amadurecendo... Ganhamos um carro novo, um companheiro, ganhamos um diploma. E
desgraçadamente perdemos o direito de gargalhar, de andar descalço, tomar banho
de chuva, lamber os dedos e soltar pum sem querer... Mas, perdemos peso!!! Já
não pulamos mais no pescoço de quem amamos e tascamos aquele beijo estalado...
Mas, apertamos as mãos de todos, ganhamos novos amigos, ganhamos um bom
salário, ganhamos reconhecimento, honrarias, títulos honorários e a chave da
cidade... E assim, vamos ganhando tempo... Enquanto envelhecemos. De repente
percebemos que ganhamos algumas rugas, algumas dores nas costas (ou nas
pernas), ganhamos celulite, estrias, ganhamos peso... E perdemos cabelos. Nos
damos conta que perdemos também o brilho no olhar, esquecemos os nossos sonhos,
deixamos de sorrir... Perdemos a esperança. Estamos envelhecendo. Não podemos
deixar pra fazer algo quando estivermos morrendo... Afinal, quemnos garante que haverá mesmo um renascer?
Exceto aquele que se faz em vida, pelo perdão a si próprio, pelo compreender
que as perdas fazem parte. Mas, que apesar delas, o sol continua brilhando e
felizmentechove de vez em quando. Que a
primavera sempre chega após o inverno, que necessita do outono que o
antecede... Que a gente cresça e não envelheça simplesmente... Que tenhamos
dores nas costas e alguém que as massageie... Que tenhamos rugas e boas
lembranças... Que tenhamos juízo, mas mantenhamos o bom humor e um pouco de
ousadia... Que sejamos racionais. Mas, lutemos por nossos sonhos... E,
principalmente, que não digamos apenas eu te amo. Mas, ajamos de modo que
aqueles a quem amamos, sintam-se amados mais do que saibam-se amados.
Afinal,o que é o tempo?"
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